Naquele
tempo, costumava dizer seu pai, as coisas eram diferentes. Essa afirmação vinha
sempre após um conselho dado pelo velho que balançava em compasso com o relógio
no fim de tarde do domingo que era o ultimo daquele mês.
Caminhando e
ouvindo as tabuas sob seus pés rangerem, foi até onde o velho estava sentado e
se despediu. No portão pediu para que Ivone não esquecesse a janela aberta.
Já em casa,
ligou a TV e o chuveiro, abriu uma cerveja e desistiu do banho. Dormiu no sofá
o último sono daquele mês quente.
O ônibus cumpria
seu primeiro horário recolhendo passageiros na parada em frente a casa de
Sandro. Em sincronia com a porta dianteira do veículo, ele abria os olhos no
mesmo horário durante toda semana. O ônibus partia e Sandro levantava para cumprir
a rotina da semana que acabava na quinta.
Sandro chegou
no mesmo horário de sempre, comentou sobre o feriado de sexta-feira, assim como
já havia feito com o camelô na calçada, com o porteiro na entrada do prédio,
com o colega do andar de cima no elevador, e agora entrava na conversa sobre o
feriado também a secretária, que só repetia o que Augusto falava, concordando
com a cabeça.
Das oito as dez
Sandro trabalhava sem notar. Entre dez horas e meio-dia trabalhava pensando no
almoço. Depois do almoço sonhava em dormir. Depois das três da tarde contava as
horas para ir para casa. Repetiu isso
mais três vezes na semana e foi para casa dizendo a todos que descansaria no feriado.
No feriado
fez sol. Sandro saiu de casa para comprar cigarro. No caminho encontrou Oswaldo
que era amigo do seu pai, mas que ainda tinha saúde suficiente para comprar cigarro
sozinho. Oswaldo comentou sobre o feriado, sobre o sol e disse que não
adiantava ir até o mercado da esquina, já que a família que trabalhava ali
havia saído de viagem e só voltava na segunda.
Haroldo se balançava
na cadeira lembrando a última visita de seu filho. Lembrou que sempre procurou ensinar para Sandro algo sobre a vida, embora Sandro nunca tenha lhe mostrado que aprendeu alguma coisa com
seus conselhos. Lembrou também que na última visita Sandro indagou sobre o que
teria feito Haroldo se tornar um idoso cheio de limitações. Haroldo já havia
chegado a conclusão de que a causa disso era por ter feito planos para um futuro
que é sempre incerto. Mas sempre preferiu resumir seu pensamento com a frase: Naquele tempo as coisas eram diferentes.
Um comentário:
É foda a gente sair desse "desculpismo" do Haroldo.
Um amigo disse que esperar as condições ideais pra tudo é o que ferra com a gente: Não fazemos tal por causa do sol, aquilo outro por causa da chuva; Tá muito frio ou muito calor.
E isso passa pelas gerações...
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